O Tapete

Da sala com o carimbo do pêlos felpudos
Esmaga o chão crudelíssimo de ladrilhos
Escamosos, perpassando a sua ausência de
Licorne inaugural à sua cor, como se vestindo
De organdi. Olho para ele, e percebo a sua
Superfície órfã; mas não de um órfão qualquer.
Superfície órfã de Orfeu e sua trágica lira,
Que plangente chorou sua amada, Eurídice.

Ah, meu amigo tapete, não chores as mágoas
Perdidas no mar de concreto e aço, no mar
Que te feriu as nádegas de pano e algodão. Nós
Somos tão sentimentais que o sentimento de
Amor fere e escarnece de nossas chagas em aberto.
Precisamos aprender com o pássaro da cristaleira,
Já timorato, a sermos mais cuidadosos com o crânio
De nossos pensamentos. O mais: que vá para o escambau

Orfeu, aquele sátiro, e sua lira; bem como Eurídice
E sua beleza estonteante! Pois tu és de ferro e aço,
Meu amigo! aguentas o tranco, com esse teu invulgar
Sorriso; aguentas a casa caindo na manhã de outono.
Não desperdiças as tuas lágrimas da mesmíssima
Matéria do fêmur! Nós somos intransponíveis, como
Montanhas que suportam em seus ombros as dores
De cordas, nos sufocando, e de caçarolas, nos afligindo.

20-2-2010. 20h 03.

Postagens mais visitadas deste blog

Taí, no escurinho do cinema,

Beijo em Apenso

Quebra de Página,