O Menino Tapado

Com suas mãozinhas de cera,
Domésticas e portáteis,
Brinca com um videogame
Que não quer te ver.
Não sabe ele da noite chegando
Sem bicho-papão,
Sem lobisomens num filme de terror
Hollywoodiano.
Não sabe do dia na saleira se escondendo.
Não sabe da hora
Em que sua mãe
Vem e chega
Com a motocicleta de bagageiro cheio
De fragrâncias da tarde indisponível.

Lá fora, tudo é solidão
Em meio à devassidão dos anseios
Não correspondidos; em meio
Às cartas frustradas,
Que não se abriram,
Cujos envelopes mofados dormem
Na escrivaninha de seu pai; em meio
À água indômita da torneira escandalosa,
Que feriu a mesa, encabulada, onde repousa
A última conta de energia elétrica,
Para pagar no final do mês.

O pai quase que engole o doido,
Com a zoada do menino.
Levanta-se da escrivaninha e
Pede silêncio de dedo indicador.
O menino, tapado que é,
Volta ao velho mundo de videogame,
Regado a silêncio e solidão.

18-2-2010. 17h 59.

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