Se eu Falasse de Amor...

Edigles Guedes

Se eu falasse de Amor como as Rosas falam
Do perfume de Esgotos fétidos de verão…
Certamente, os Esgotos secariam, e a fedentina
Exalaria nos narizes das Rosas pútridas.

Se eu falasse de Amor como as entrelinhas
Angustiadas por um personagem de Dostoiévski…
Certamente, a Náusea consumiria o papel em branco
E o Vômito destilaria o seu ódio contra a Tinta negra…

Bastante negro seria o sangue das Horas
Consumidas em uma taça de crime
E num cristal de Castigo! A obra nos pune?…
Se eu falasse de Amor como a galinha

Num conto de Clarice Lispector —
Certamente, o vértice do vento varreria
O Ocidente nuns arrebatadores tornados…
Se eu falasse de Amor como a boca aleivosa

Fala para o Ouvido tétrico de mercador…
Certamente, a Xícara agastou-se com o Garfo,
A Faca arrufou-se com o Pirex,
A Manteiga desaviu-se com o Pão,

A Panela desabriu-se com o Arroz,
A Tampa aborreceu-se com o Feijão.
Se eu falasse de Amor como a paquidérmica
Barata do Franz desengonçado Kafka…

Certamente, a Barata filosofaria com a inércia
Do corpo despertado naquela manhã advocatícia.
Há tanto para se dizer do Cansaço do dia tenebroso,
Quanto da morosa noite de Inverno alentador.

Salgueiro, 28-2-2009 e 24-1-2010.

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