Inteiro



Ah! O conceber-me por inteiro,
Quando, em verdade, sou metade
Da metade do inteiro fútil,

Que não sou. Nunca inteiro sonho
Em ser; se não me cabe, ponho
Na fronte aquele inexpressivo
Til, como tal chapéu de palha
Do campônio tão vespertino.

Ah! O cindir-me entre inteiro e não,
Que não cabem nos livros vesgos
De matemática, de páginas
Marcadas, ressabiados, frustros,
Orelhas queimadas por dedos
Lépidos, ao virar a folha
Qualquer, de medo ou avidez.
Medo que o dia acabe em nada,
Sem leitura na tabuada
Dos números da fina vida.
Avidez de quem sofre a gula
Dos segundos tão raros, díspares.
E eu que não sou veraz inteiro,
Cheio de muitas e lutas lástimas,
Vivo de rastejar meu corpo
Por entre ruas e tetos caros,
Por drope flor espezinhada
E jardim tão despedaçado!…
Espatifado por patifes,
Que desconhecem o prazer
Do singelo cheiro da flor!…
Ruge coração por amor,
Que se foi, sem dizer adeus,
Sem ponto final, sem o Nada!

Autor: Edigles Guedes.


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